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sábado, 23 de março de 2013

PASSOU-SE EM COIMBRA


Na Real República Rapó Taxo tive grandes amigos. Frequentava-a com frequência, muitas vezes para uns copos num anexo da vivenda transformado em adega, menos vezes para estudar com dois colegas que ali viviam.
Certo dia, estava o Guedes a contar à malta que o ouvia atentamente, que tinha engatado uma matrona na Alta que morava numa ruela por trás da Faculdade de Farmácia.
- Uma mulher na casa dos 40 anos, boa, matulona? – perguntou o Noronha
- Sim, ela já é um bocado descriada, mas é boa, de carnes fartas. – assentiu o Guedes.
- Chama-se Bina? – interpelou-o o Noronha, já desconfiado.
- Essa mesmo!  Só me deixa lá ir da parte da manhã, que a gaja diz que à tarde tem de trabalhar e que à noite vai lá a casa um velho sexagenário que é quem a sustenta.  De mim é que ela nunca levou um tostão. Mas como é que sabes?
- É que a mim ela só me deixa lá ir de tarde, porque de manhã tem um emprego e à noite tem um velho sexagenário que lhe vai dando uns cobres para a sua sobrevivência. Mas olha que a mesada que recebo lá de Mangualde quase nem chega para comer e por isso também nunca lhe dei nada. Além do meu corpo, claro!
As gargalhadas dos circunstantes estalaram e o Guedes e o Noronha não tiveram outro remédio senão admitirem, com risos amarelos,  que andavam os dois a ser enganados pela Bina.
Mas um nosso colega houve que em vez de rir, tinha metido a cabeça entre as mãos e as lágrimas corriam-lhe pela cara. Era o Varela, rapaz bem parecido, um tanto ingénuo, caloiro chegado nesse ano a Coimbra vindo de Trás-Os-Montes.
- Eh pá, o que é que se passa. Estás doente?, perguntou um.
Eu sou o sexagenário que vai lá à noite e que a sustenta, foi a resposta sussurrada do Varela...

Rui Felicio

9 comentários :

  1. E ainda dizem que Coimbra tem mais encanto na hora da despedida...
    Coimbra tem mais encanto... sempre!
    Rui Felício, posso publicar n'a funda São?

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  2. Mais uma boa leitura que me entusiasmou.
    O final é de gritos...
    Este para para a São Rosas é de estalo!

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    1. Claro. Este e mais dois já estão na forja n'a funda São.

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  3. Ou era a única "mulher" naquela ruela por trás da F.Farmácia ou então, por mera coincidência, quis o destino que estes três amigos o Varela, o Guedes e o Noronha se encaminhassem para o mesmo sítio!... Assim como foi o destino, que numa conversa de "homens" entre eles, chegassem à conclusão que todos andavam a "comer" do mesmo prato...só que como sempre na vida, há os espertos e os menos espertos, e este ultimo foi o Varela, que além de levar o rótulo de velho, sempre que lá ia tinha também de deixar alguns tostões da sua magra mesada! Como da "discussão" nasce a luz...para o Varela foi a escuridão total, que coitado, se abateu sobre ele!!!!!
    Leve e engraçada esta tua narrativa! Obrigada.

    TERESA LOUSADA

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  4. Afinal o "passa-palavra" das sentinelas dum quartel, não é prerrogativa das mulheres, também acontece com os homens que tudo contam, mesmo tratando-se duma matrona a trabalhar no seu ofício milenário. Imagino bem os sorrisos machistas destes rapazes bem posicionados no corpo da pobre Bina, que muito ensinava porventura a estes estudantes imberbes, mas petulantes! Pena tive foi do Varela - transmontano, ingénuo, crédulo e generoso! Esse, sim, mereceu todo meu aplauso e senti por ele um certo carinho maternal, porque ainda não poluído pelo soberbo machismo de então! Entre o riso saudável e a insolência, os jovens viviam o sexo oferecido, ora com um certo carinho, ora com certa galhofeira partilhada!

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  5. Falei demais e não disse o principal: o seu texto, como já nos acostumou, está esplendidamente urdido e deu-nos uma visão muito real do que se passava nesses anos! Recordo-me perfeitamente de histórias semelhantes narradas pelo meu marido! Muito obrigada, Rui Felício, pelo seu dom de escrita!

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  6. Escrevi demais, sem dizer o principal! A sua história está esplendidamente urdida e conta, com muito realismo, o que se passava naqueles anos de antanho, coisa impensável nos dias de hoje!
    O seu talento para a escrita conduz-nos aonde nos quiser levar, porque é tão apelativa como a flauta de Hamelin...

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  7. Rui Felício, tenho provocado danos aqui no seu blog, pelo simples facto que não sei bem lidar com isto e ando às aranhas, porque umas vezes o comentário desaparece (mas eu tenho antecipadamente feito "copy" para o que der ou vier...)outras aparece em duplicado, faço eliminar, mas essa acção, já de vergonha, fica patente no espaço...Parece que já começo a perceber algo disto e que não vou estragar mais as suas páginas! O meu humilde perdão!...

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  8. Não se preocupe, Maria Mesquita.
    Sempre que me aperceber da sua eliminação de comentários, removê-los-ei.
    Mas isso não . Conhecemé o importante.
    Importante é a liufada de ar fresco que a sua presença trouxe a este espaço quase incógnito onde me limito a guardar os textos que acho não merecerem a publicação noutros lugares mais nobres, como já antes lhe tinha dito.
    É uma espécie de armazém...
    Os mes amigos ( a maior parte deles ) nem o conhecem. Conhecem sim alguns textos que costumo publicar no Facebook.

    Obrigado uma vez mais pela sua presença aqui e pelos excelentes comentários que tem produzido ( alguns deles elogiosos em demasia, diga-se...).

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