Web Analytics

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

O HÁBITO FAZ O MONGE?

Os proprietários daquele Café do Porto ao fundo da Av. da Boavista, perto do Castelo do Queijo, gabavam-se de terem uma clientela seleccionada, da burguesia portuense, supostamente oriunda das mais conceituadas famílias nortenhas. Não que lhes fosse exigido qualquer certificado genealógico. Bastava escutar-lhes o sotaque afectado, observar-lhes os trejeitos estudados, os maneirismos, o vestuário de marca.
Certo dia, três operários de uma obra de construção das imediações, vestidos de fato-macaco, entraram no tal Café, sentaram-se a uma mesa e pediram três “cimbalinos” e três bagaços, fuzilados pelos olhares críticos de duas senhoras que abanavam a cabeça, em frente, bebericando chá, com ar enjoado.
O empregado, trajado a rigor, de impecável “blazer” branco e lacinho preto “à papillon”, apontou-lhes a porta da rua, intimando-os a sair e a lerem a tabuleta afixada na porta com os dizeres “Reservado o Direito de Admissão”.
Uns tempos depois os mesmos operários voltaram ao Café, agora de fato e gravata, os cabelos irrepreensivelmente penteados sob uma densa camada de brilhantina. Um deles, fumando charuto, chamou o empregado e pediu-lhe três “Martell” em balão aquecido. Instantes após, o empregado, que não os reconhecera, regressava à mesa, com a garrafa do famoso cognac e três copos fumegantes em cima da bandeja.
Tomadas as bebidas, chamaram o gerente e informaram-no que não pagariam a conta porque os copos estavam demasiadamente aquecidos e porque os cognac’s eram uma surrapa, certamente fabricada em destilaria clandestina de Sacavém. Levantaram-se e encaminharam-se para a porta, seguidos pelos salamaleques, pelas vénias e pelos repetidos pedidos de desculpa do dono do café, que garantia a Suas Excelências que tal não se repetiria.
Obteve como reposta de um deles, que lhe apontava a tabuleta afixada na porta:
- Você é que devia ser impedido de entrar nesta espelunca!

Não sei se, naquele tempo, existia suporte legal que sustentasse essa tarja de “Reservado o Direito de Admissão”, que proliferava nos estabelecimentos comerciais na década de sessenta.
 Actualmente, sei que não é legalmente sustentada essa afixação.
Os estabelecimentos de restauração e os bares, são espaços públicos aos quais todos têm acesso e direito de permanência, salvo se manifestamente apresentarem sinais de embriaguez, se não mostrarem qualquer intenção de utilizarem os seus serviços ou se se recusarem a cumprir as suas normas privativas, desde que devidamente publicitadas.   
Felizmente os tempos mudaram...

Rui Felício

Sem comentários :

Enviar um comentário